Comboio do Amor

Agora o que me resta fazer é o impossível. Já aspirei furiosamente o quarto para apagar qualquer sinal da tua presença, rasguei fotografias e troquei os lençóis. Mudei o perfume, dizias que eu cheirava bem, e deixei de usar bâton do cieiro para amaciar os lábios. Agora o que me resta fazer é o impossível.
Conheces a Teoria do Caos, meu amor? Como o bater de asas de uma borboleta pode provocar uma tempestade no outro lado do Mundo? É isso, estás a criar um verdadeiro tufão com essa irrealidade em que te envolves. Não passas de um sonho tão vão, e na ânsia de que querer que fosse para sempre, não me apercebi que fugias de mim como a areia outrora me escapava por entre os dedos enquanto te observava no mar. Esta noite eu caí e não me levantei. E quando a minha mãe me olhou dizendo – o que se passa contigo? – eu disse – andei a sonhar acordada e agora dói.
Não sei o que são cartas de amor, o que dizem e muito menos do que falam, já que só me resta o impossível. Agora tudo o que me dás é vontade de passar as noites em branco para ter a certeza que não voltas, tudo o que me dás são noites em que acordo a chorar e onde só tenho força para pôr mais um comprimido à boca, onde me perco em pesadelos intermináveis que me fazem dar voltas e voltas na cama para te empurrar fora dela, tudo o que me dás é um peso do lado direito, porque do esquerdo levaste tudo e deixaste o que faz parte de ti – o vazio.
Quando tudo o que me resta é o impossível, deixa-me adormecer mais uma vez, embalada nos teus braços e amanhã de manhã vai, permite que se torne possível e devolve-me o que é meu.
Não voltes a escrever-me, porque eu voltarei a fazê-lo até esquecer-te, meu amor.